Nas redes sociais, vem ganhando força um exercício que promete grande perda de gordura e ainda deixar o abdômen trincado, com os desejados “gominhos”. Trata-se do chamado “abdominal das chinesas” – ou desafio asiático -, que conquistou adeptas no mundo todo ao garantir resultados em 15 dias.
Mas será que a técnica, de fato, traz resultados? O exercício pode trazer riscos? Veja a seguir:
Como funciona?
Analisando o exercício proposto, podemos ver que envolve dois movimentos na pelve, para frente e para trás, que recebem o nome de anteversão e retroversão. A atividade recruta também a coluna vertebral em movimentos de extensão e flexão e algumas variações de braços, que são complementares ao exercício principal, para dar mais intensidade.
A pelve pode ser considerada o elo entre os membros inferiores e o tronco, e qualquer mudança no seu posicionamento gera mudanças na coluna vertebral. Para que a pelve se desloque em anteversão – ou seja, para frente, deixando o “bumbum arrebitado” -, é necessária a ação dos músculos flexores do quadril (entre eles o reto femoral e iliopsoas) e os eretores da espinha. Agora, para que a pelve se desloque em retroversão – para trás, como se colocássemos “o rabo entre as pernas” -, é fundamental a ação dos músculos isquiotibiais, glúteo máximo, reto abdominal e oblíquos.
No vídeo a seguir, do canal Saúde na Rotina, veja como funciona o exercício:
Acredito que venha daí a promessa de que você vai ficar sarada fazendo esse exercício, por recrutar músculos da parede abdominal, do bumbum e da coxa, partes do corpo que geram insatisfação em muitas mulheres. Entretanto, neste exercício a pelve acaba sendo exigida numa intensidade absurdamente alta, com movimentos bruscos, que não têm muitos graus de amplitude (mesmo para aquelas pessoas com mais mobilidade) e que gera sobrecarga na coluna também.
Uma coluna vertebral saudável é aquela que se movimenta com frequência, que tem flexibilidade e mobilidade. Entre as vértebras (ossos), temos os discos intervertebrais, estruturas gelatinosas que permitem todos os movimentos entre as vértebras. Por isso, as partes da coluna que têm mais movimentação são as que possuem os maiores discos intervertebrais, como, por exemplo, a coluna torácica. Já a região do sacro (pontinha final da coluna) não possui discos e tem um grau muito pequeno de movimentação.
Há riscos?
Na minha opinião, há dois problemas com essa nova moda:
1. Movimentos bruscos e extremamente repetitivos, isolados numa única região do corpo
Você já ouviu falar em lesão por esforço repetitivo? Repetir um mesmo padrão de movimento por muito tempo pode levar à degeneração das articulações envolvidas. Esse tipo de lesão é comum em esportistas e no caso de trabalhadores que precisam executar os mesmos movimentos todos os dias.
Em qualquer programa de treinamento, é essencial que sejam exploradas as amplitudes de movimento de todas as articulações e que tenhamos variações dos exercícios, estimulando os músculos e articulações em todas as suas possibilidades. Além disso, a prescrição de treino não é feita de forma linear, aumentando a intensidade até o infinito: são necessários períodos de baixa intensidade e de recuperação.
Ainda que a coluna possa suportar grandes cargas e esteja apta a fazer movimentos em diferentes direções, a realidade é que as pessoas são sedentárias e passam a maior parte do tempo sentadas, gerando desequilíbrio nos músculos que estabilizam a pelve (encurtamento dos flexores de quadril e enfraquecimento do glúteo e do abdômen, por exemplo). Por isso, gera preocupação um tipo de treinamento que exija movimentos bruscos sem a consciência corporal necessária para evitar lesão.
2. A promessa de perda de peso e abdômen “trincado”
É claro que, se uma pessoa totalmente sedentária passa a fazer 20 minutos desse exercício por dia, ela vai perder peso, porque qualquer estímulo é melhor do que nenhum estímulo.
Mas esse emagrecimento também funcionaria se ela fizesse qualquer atividade física por 20 minutos, como caminhar, limpar a casa, andar de bicicleta. Além disso, a perda de peso ocorre quando há déficit calórico – ou seja, precisamos consumir menos calorias do que estamos gastando. Caso contrário, não vai haver perda de peso, independentemente do exercício que você fizer.
Outro argumento usado para justificar a suposta eficácia desse exercício é a grande quantidade de suor de quem pratica a atividade. Não custa lembrar: suor não é indicativo de perda calórica, apenas significa que o seu corpo está tentando regular a temperatura interna frente à demanda de movimento. Sedentários também costumam suar mais do que indivíduos treinados. Suar em excesso não significa queimar mais calorias. Para perder gordura e “trincar” o abdômen, há apenas uma “fórmula”: exercícios bem planejados e executados aliados a uma boa alimentação e sono de qualidade.
Por que não vale a pena testar
Não existe milagre, e nunca vai surgir algo revolucionário para ajudar a emagrecer rápido e sem muito esforço. A constância, a persistência e a determinação são ingredientes fundamentais para manter hábitos saudáveis a longo prazo, que vão, sim, trazer resultados físicos e estéticos.
Aderir a um exercício como esse sem a devida orientação profissional pode trazer riscos à sua saúde, como lesões na coluna, hérnia de disco, dores nas costas, problemas nos joelhos, entre outros. Talvez você não sinta nenhum desses sintomas nos primeiros meses de prática, mas será que vale a pena arriscar a saúde da sua coluna no futuro? Busque ajuda profissional de educadores físicos capacitados.